domingo, 5 de dezembro de 2010

O dia em que acordei

Este texto foi escrito em setembro de 2010. Postei e voltei a esconder algumas vezes, por medo de ser julgada. Minha mãe leu e me disse que não deveria escancarar esta história. Pensei muito, e não consigo encontrar um motivo forte que me faça escondê-la. Pelo menos não agora.

Fiquei com vontade de contar um pouco da minha história... Tenho vontade de relatar certas situações da minha vida para, quem sabe, servir de motivação ou conforto para alguém que já tenha passado pelo mesmo, ou que esteja passando por isso.

Algumas pessoas sabem que eu fui casada e tenho um filho desse casamento. Na verdade, não casamos... moramos juntos por seis anos. Terminamos este ano, 2010, dia 12 de junho, dia dos namorados. No dia em que a maioria dos casais estava comemorando, o pai do meu filho me agrediu, mais uma vez, física e moralmente. Pela última vez.

Sim, isso já tinha acontecido antes... e muitos se perguntam porque eu continuei com ele depois da primeira vez que ele me agrediu. Eu respondo: porque estava apaixonada. Porque não queria voltar para a casa da minha mãe. Por que queria que meu filho crescesse com seu pai ao lado. Porque achei que ele fosse mudar...

Não estou aqui para discutir os fatores psicológicos que levam um homem a agredir uma mulher, nem para tentar justificar minha insistência em uma relação-bomba. Estou aqui só para contar esta história.

Antes de me separar dele, me certifiquei de que poderia criar meu filho sozinha, que poderia pagar as minhas contas, que eu estava preparada para enfrentar o mundo. E foi o que fiz: Comecei, por indicação do meu irmão, a trabalhar como corretora de imóveis, pois dar aulas de inglês e espanhol ou fazer shows não era o suficiente para que eu assumisse esse risco naquele momento. Não que ele sustentasse a casa, mas sempre vivemos com a ajuda dos nossos pais, o que para mim não era justo, nem o correto. Eu precisava pagar minhas próprias contas, e queria muito fazer isso sem ele. Consegui engrenar na corretagem, fiz algumas vendas, paguei o conserto do carro, comecei a pagar pela master do primeiro CD que gravei - e que ficou retida com o empresário que bancou a gravação - assumi as contas da casa, me dei o luxo de comprar roupas para mim que há tempos eu não comprava... me dei o luxo de viajar, de gastar relativamente bem com pequenas vontades que eram minhas e que ele não podia satisfazer. Ele começou a se sentir mal por isso... a sentir que eu estava deixando ele de lado, começando a ganhar muito mais que ele, iniciando uma vida da qual ele não conseguia fazer parte, não aceitava, não compartilhava. Ele, que sempre me teve por perto tratando de diminuir a todos meus amigos, os músicos com quem eu convivia, as pessoas que me faziam bem... ele que sempre me teve por perto sugando minha energia... ele me viu começando a viver de novo, e isso o incomodou. Foi aí que ele explodiu. Por um motivo pequeno, resolveu descontar toda a sua frustração de uma só vez. Me jogou no chão, tentou me sufocar, jogou o peso do próprio corpo sobre mim, disse que iria me matar. Me xingou de muitos nomes que nem me lembro, me segurou forte no rosto e disse que eu o estava humilhando. Me humilhou e agrediu porque disse se sentir humilhado por mim. Me deixou uma marca que parecia um soco... era a marca dos dedos dele apertando forte meu rosto. Tão forte, que chegou a ficar roxo logo em seguida. Ele chegou a perguntar se foi ele mesmo quem fez aquilo. Ele não lembrava...
Quando meu filho, que dormia no quarto ao lado, acordou, veio no meu colo, viu a marca e perguntou se era o pai dele que tinha feito aquilo, eu decidi que não podia mais aguentar aquela situação. Decidi ali que era o fim daquele relacionamento.

No dia seguinte, eu tinha o lançamento de um produto importantíssimo na empresa onde trabalhava, a Cyrela. Era o lançamento do primeiro empreendimento comercial da Cyrela em Curitiba. Não podia faltar. Fui com a marca no rosto. Todos me perguntavam o que era aquilo... eu criei a desculpa da porta no carro que bateu no meu rosto num erro de cálculo meu ao fechar... todos fingiam que acreditavam. Eu fingia que estava tudo bem... por dentro, estava destruída. Não só pela vergonha, mas também pelo medo do futuro. O empreendimento comercial era um produto difícil de vender, muito mais complicado que um residencial... eu tinha alguns clientes para lá, mas consegui vender apenas uma unidade. Depois do que aconteceu, não consegui vender nenhuma sala comercial. Não sei dizer se era emocional ou se era o produto que foi complicado mesmo. Acho que foi tudo junto. Durante dez ou quinze dias, não lembro agora, fiquei com uma marca no rosto que passou por todas as cores do arco-íris: roxo com vermelho, violeta, azul, verde e amarelo com laranja. Obviamente não estava com a aparência mais agradável para atender clientes. E tenho quase certeza de que algumas vendas não se concretizaram por esse motivo. pois bem, não me sinto mal por isso... até me admiro por ter tido a coragem de enfrentar trabalho, colegas, clientes, família, espelho e vida inteira pela frente com a marca que fosse no rosto e sinceramente: foda-se. Eu estava livre. Me livrei de um vampiro que usava máscaras de gentileza no dia-a-dia para me confundir... que dizia que me amava, mas me maltratava. E na verdade, quase diariamente. Com pequenas doses verbais de maltrato. Quando não mais conseguia me atingir, partia para o físico. E assim foi, durante seis anos. Eu venci.

Assim como venci muitas outras dificuldades na minha vida, essa foi mais uma. Tenho vencido, pois ainda estou em batalha. Sobretudo, estou LIVRE! Enquanto eu estiver com saúde, força, trabalhando, compondo, cantando, gravando, VIVENDO, e tudo isso com meu filho do meu lado, nada, mas nada mesmo importa. Meu filho e meu sonho são tudo pra mim... NADA MAIS ME ASSUSTA.

Se tenho medo? Pô... claro que tenho... mas a coragem é maior ainda.

Depois do que aconteceu, fiz denúncia na delegacia, abri processo contra ele, fui fazer exame no IML... segui todo aquele esquema. No início fiquei um pouco envergonhada por estar passando por tudo aquilo... depois percebi que não era a única, e pude dividir a minha história com outras mulheres... algumas que tinham passado por coisa muito pior. Algumas que viviam em infernos muito mais quentes que o meu.

Eu decidi que iria deixar de viver nesse inferno no dia dos namorados de 2010. Nesse dia, entendi que existia um mundo inteiramente novo lá fora me esperando para ser descoberto. Um mundo onde eu estivesse melhor comigo mesma, me descobrindo a cada dia, valorizando novamente a mulher, a artista, e, sobretudo, a humana que eu sou.

Venho superando todos os dias as marcas que ficaram aqui dentro... ainda nem fiz uma música para tudo isso porque ainda é muito recente. Agora mesmo eu tô chorando... foi difícil. Tem sido difícil. Mas eu tenho vencido cada dia um pouco mais, e isso me mostra o quanto sou forte, e como me fez bem tomar a decisão de viver a minha vida de verdade.

Vale a pena se separar de alguém que não vale a pena.

É difícil se despir assim... mas sinto que foi preciso contar um pouco sobre mim para quem quisesse ler e me conhecer mais.

Quais são meus planos? Desejo MUITO ir para São Paulo e para o Rio... mostrar para o Brasil a minha música. Só não sei exatamente como vou fazer isso. Talvez até mesmo dentro da corretagem... não sei. Sinto que é muito possível que isso aconteça. Sinto como uma realidade futura, que vejo de verdade. Consigo imaginar as ruas, as situações... sinto muito de perto o eixo Rio-São Paulo. Como se ali eu já morasse, já vivesse.

Já tentaram me apagar... já vivi com inimigos. Me separei deles, e até perdoei... não esqueci. Perdoei. Lembro muito bem dos nomes e dos motivos. Disso não esqueço nunca. Mas perdoar é libertador.

Viver de verdade, é mais libertador ainda. Sentir nas entranhas (já contradizendo um trecho da Nada Mais), muitas vezes é preciso sentir nas entranhas... ali está a verdade dos sentimentos. Alguns são tão poderosos que vêm acompanhados de cheiros e datas. Pois então, esse será o dia dos namorados do qual eu nunca mais vou me esquecer... Será o dia dos ACORDADOS para mim. Para sempre.

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